No dia 28, segunda-feira, como tenho feito nos últimos meses, pelo menos uma vez por semana, fiz outra pequena viagem a trabalho para atender uma cliente de Consultoria em Plano de Negócio. Sua empresa está localizada em Nova Iguaçu.
Mais um dia de atividades prazerosas, apoiando minha cliente e sua equipe gerencial no desenvolvimento de seu Plano de Negócio e Manual de Organização. Só tenho motivos de agradecimento pelas demonstrações de confiança e de acolhimento que recebo permanentemente, por parte de todos os colaboradores da empresa.
E, enfrentando meu desafio de aproveitar, da melhor maneira possível, as horas que passo no trânsito durante os intervalos de deslocamento na ida e na volta para esse trabalho, dessa vez minha atenção foi despertada por mais um desses acidentes que, infelizmente, somos obrigados a testemunhar e constatar, às margens da Via Dutra. Aproveitei, então, o resto da viagem para fazer um balanço de minhas aventuras pelas estradas nacionais e internacionais, como motorista e motociclista, desde o ano de 1972, quando recebi minha habilitação. Esse foi o tema de meu exercício diário de gratidão.
O saldo dessa verificação foi extremamente positivo: nenhum acidente grave em 40 anos de direção e pilotagem! Fazendo uma conta rápida, estimando pelo menos 20.000 km por ano de carro e uns 10.000 km por ano em motocicleta, em uma avaliação bastante conservadora, penso que já ultrapassei a marca de 1.000.000 km rodados em 40 anos de estrada. E mais impressionado fiquei com a quantidade de pessoas com quem me sinto em débito de gratidão para que isso acontecesse dessa maneira.
No ano de 1972, Aspirante da Escola Naval, onde permanecia de segunda a sexta em regime de internato, só conseguia cruzar os muros da Ilha de Villegagnon a pé, correndo pelo Aterro do Flamengo, durante o treinamento da Equipe de Karatê. Meu veículo de fim de semana era o carro emprestado pelo meu pai, um Volkswagen novinho de cor creme. E meu velho pai, que já nos deixou, foi meu primeiro exemplo de motorista a quem procurei modelar. Ficava todo orgulhoso a bordo do seu Mercury 1952, no início dos anos 60, quando viajávamos pelas estradas dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Em seus quase sessenta anos de direção, nunca se envolveu em acidentes. E me passou dicas preciosas de direção defensiva em diversas oportunidades. Sou grato por isso! E tive permissão de dirigir todos os seus carros, vários modelos da Volkswagen, pelo menos dois Passat, e alguns da Fiat, até que, muitos anos depois, comprei meu primeiro carro, um VW Gol zero km.
Meu primeiro veículo, com certificado de propriedade em meu nome, foi de duas rodas. Em 1975, usei meu primeiro salário, logo após a formatura, para comprar uma Honda CB 250 importada. Motivo de preocupação para minha mãe… E essa moto foi meu principal meio de locomoção, a trabalho e em viagens de lazer, durante muitos anos. Aprendi a pilotar em uma Suzuki de um bom amigo e, depois dessa primeira Honda vieram outras motos: Uma Yamaha RD 125, outra RDZ 135, e a última, uma Honda Twister 250. Durante muito tempo tive mais quilometragem em duas rodas do que em quatro. Carro, só nos fins de semana, ou quando chovia muito.
É claro, levei alguns pequenos tombos, mas nada grave. Óleo ou areia na pista, antigos trilhos de bonde em uma curva na cidade ou placas de metal cobrindo o piso de alguma obra, uma freada mais brusca, e as luvas faziam seu trabalho de proteger as palmas das mãos no tombo certo. Mas nada grave, a não ser pequenos arranhões no capacete e no meu amor próprio.
Sou grato aos muitos motoristas que cruzaram comigo nessas ocasiões e que não tiveram que carregar o peso em suas consciências de ter atropelado um motociclista trapalhão, em início de pilotagem. Minhas antigas namoradas, em especial a última delas que se tornou minha mulher, que se arriscaram comigo em algumas viagens em duas rodas ou apenas passeando pela cidade, também são endereçadas de palavras de gratidão. Compartilhamos momentos de pura cinestesia, que guardo na memória corporal, com o vento soprando no rosto e em nossos ouvidos, dois corpos unidos como um só, em cada freada e curva da estrada, com seus braços em volta do meu corpo em um abraço firme e carinhoso.
Viagens em duas rodas foram muitas, sozinho, com alguém na garupa, ou com algum amigo me acompanhando em outra moto. No ano de 2010, recebi de meu amigo Paulo Roberto Ramos da Silva, uma foto que outro amigo tirou quando nos encontramos por acaso, eles em carro alugado e eu em uma moto alugada, na base do vulcão El Teide, a cerca de 2.000 metros de altitude, na Ilha de Tenerife, no Arquipélago das Canárias, em 1976. Saí de Santa Cruz cedinho, depois de alugar uma moto de apenas 100 cc, a única disponível na locadora, para passar o dia na estrada sentindo o vento no rosto e conhecendo a paisagem do Parque Nacional do Teide, que cerca o único vulcão naquela ilha. Estradinha de mão dupla, cheia de curvas, subindo em direção às montanhas, com direito a cruzar uma pequena floresta de pinheiros na saída da cidade e, depois, a paisagem lunar de lava erodida por kilometros a fio. Levei minha bolsa Sansonite com equipamento fotográfico, mas não consegui encontrar as fotos daquele dia. Fiquei muito feliz quando recebi o presente do meu amigo com o seu registro fotográfico da minha figura desengonçada, cavalgando aquela pequena Yamaha RS 100.
No único acidente mais grave em que me vi envolvido até hoje, eu não estava dirigindo. Era passageiro de um ônibus interestadual e seguia junto com um amigo do Rio de Janeiro para passar o feriado de sete de setembro em Barra Mansa, na casa de minha avó materna. Fechado por outro carro, nas proximidades de Barra do Piraí, nosso ônibus saiu da pista e desceu uma ribanceira até tombar de lado, vários metros abaixo da estrada. Felizmente, tombou para o lado oposto da janela onde me encontrava e saí por ela, saltando da lateral do veículo para o barranco. Algumas pessoas se feriram sem muita gravidade, meu nariz sangrou um pouco com o impacto em algum lugar e foi só. Mais um motivo de agradecimento.
Sou grato, portanto, a todos os outros motoristas e motociclistas com quem tenho cruzado pelas estradas da vida que, com sua direção consciente, têm evitado colidir comigo em alguma ultrapassagem mais ousada ou em dias e noites chuvosos e de baixa visibilidade. Sou grato, também, aos projetistas e fabricantes dos nossos veículos de locomoção, à legião de pessoas encarregada de fazer a manutenção e a sinalização das ruas, vias expressas e estradas, bem como aos engenheiros que projetaram, às empresas de engenharia que construíram e aos órgãos do Governo que fiscalizaram cada uma das obras de arte, pontes, viadutos e autoestradas por onde circulamos. Caminhos e veículos que nos levam ao nosso destino e nos trazem de volta para casa, em segurança.
Sou grato por isso!
Eduardo Leal
Foto do Parque Nacional do Teide de autor desconhecido
Foto do nosso grupo de João Carlos Santos Pombo